São Paulo, a maior cidade do Hemisfério Sul e a mais rica da América Latina, tem hoje 994.926 famílias vivendo em situação de risco, em áreas precárias ou em terrenos irregulares. São entre 3 milhões e 4 milhões de pessoas, muito mais do que a população de Salvador, Belo Horizonte, Curitiba ou Brasília. Isso significa que um terço dos paulistanos tem residência atualmente em favelas, loteamentos irregulares, cortiços, conjuntos irregulares e outros assentamentos que desafiam a política habitacional da capital.

Nos últimos 50 anos, o número de centros urbanos cresceu mais que cinco vezes na América Latina e no Caribe e hoje a metade da população urbana na região (222 milhões de pessoas) vive em cidades com menos de 500 mil habitantes. De acordo com o relatório Estado das Cidades da América Latina e do Caribe, divulgado nesta terça-feira (21) pelo Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-Habitat), cerca de 14% dos habitantes da região estão nas megacidades (65 milhões).

O êxodo rural perdeu força e as migrações ocorrem hoje, sobretudo entre centros urbanos. O crescimento populacional também tem caído, o que contribui para a queda do desemprego e da pobreza. Segundo o oficial principal de Assentamentos Humanos do ONU-Habitat, Erik Vittrup, essa oportunidade de tornar as cidades mais inclusivas e melhores para seus habitantes pode ser desperdiçada se não forem revistos os atuais modelos de crescimento e desenvolvimento nas cidades da região.

“Os modelos de crescimento das cidades nos anos 90 e anteriores não se adaptam aos desafios atuais. É ridículo que estejamos reproduzindo modelos de cidade focados na expansão horizontal. A vantagem de morar na cidade é a concentração urbana, da estrutura urbana, de serviços”.

Para o representante da ONU, a densidade demográfica reduz custos e impactos ambientais, além de estimular a criatividade e a cultura. Esses benefícios só podem ser sentidos se houver uma boa administração e planejamento urbano.

“Não precisamos de mais terras para uma cidade crescer. Ela pode crescer para cima, por exemplo”, disse. Ele citou também como alternativa o reaproveitamento das zonas centrais subaproveitadas, que já têm infraestrutura e equipamentos prontos.

Se em 1950 havia 320 cidades com pelo menos 20 mil habitantes, meio século depois o número passou para 2 mil. As metrópoles (com mais de 5 milhões de habitantes), que não existiam na América Latina e no Caribe em 1950, hoje somam oito na região: Cidade do México, São Paulo, Buenos Aires, Rio de Janeiro, Lima, Bogotá, Santiago e Belo Horizonte.

Comunidade carente ocupa um morro em Caracas, capital venezuelana. Foto de Jorge William (Extraído do Google)

As cidades com maior densidade populacional são as que estão crescendo menos em termos populacionais desde a década de 1980 e, ao mesmo tempo, perdendo vantagens competitivas. Já as cidades com menos de 1 milhão de habitantes são as que mais têm crescido, mas também indicam movimento de queda.

O estudo mostra que a especulação imobiliária é um problema comum na maior parte dos países estudados e contribui para a expansão das periferias, do número de rodovias e centros comercias, além de condomínios fechados. Esse tipo de crescimento também estimula o uso de transportes individuais em detrimento da criação de um tecido urbano interconectado. As consequências são congestionamento, poluição e periferias que crescem desordenadamente, sem infraestrutura e sem meios de transporte adequados.

“Com isso, há aumento do preço do transporte, da energia, a degradação do meio ambiente, de dinheiro público que deveria estar sendo investido de outras formas, entre outros problemas”, citou Vittrup.

A pesquisa mostra ainda que o número de veículos individuais duplicou nos últimos dez anos, sem planejamento a longo prazo para lidar com os desafios da mobilidade urbana. O relatório elogia as iniciativas de alguns governos de resgatar as zonas centrais, criar ciclovias, mas lamenta que essas não sejam uma tendência.

Agência Brasil